terça-feira, 3 de abril de 2012

"Fui abusado pelo meu próprio tio"

Veja o depoimento de um homem que resgatou a dignidade na IURD, através da fé, após ter sido violentado sexualmente na infância

É muito difícil para uma pessoa abrir seu coração e trazer à tona lembranças de um passado não muito feliz; trágico, na verdade. Vítimas de pedofilia são pessoas que carregam um fardo pesado e levam marcas da violência praticada por gente que muitos preferem nem chamar de ser humano. A seguir, o relato do advogado José Luiz Santos (*), de 33 anos, que teve a infância marcada pelo trauma de ter sido violado até pelo tio, mas que recuperou a autoestima através da fé em Deus.

Como e com que idade você foi abusado sexualmente?

Por volta dos meus 6 anos. Fui violentado sexualmente por um homem muito próximo da minha família, que não despertava nenhum tipo de suspeita. Hoje, situações desse tipo são comuns de serem denunciadas, e até vão parar nos jornais e noticiários. Porém, quando aconteceu comigo, isso não fazia parte das preocupações dos pais e mães daquela época, o que tornava as pessoas que praticavam barbaridades desse tipo ainda mais invisíveis.

Como foi a abordagem do pedófilo?

As imagens que tenho na minha memória são desse homem me levando para “brincar” em sua casa, com o consentimento de minha mãe, que não fazia ideia do que aquilo representava. Lá, lembro-me que ele se despia, e a mim também, e praticava coisas comigo que fugiam completamente do meu entendimento do que era certo ou errado até então. Não lembro nem mesmo o nome desse homem. Recordo que, de uma hora para outra, ele foi embora, mudou de cidade. Mesmo depois de adulto, nunca perguntei dele para a minha mãe.

Infelizmente, você foi vítima de abuso sexual, novamente. Sendo que desta vez o homem em questão era seu tio, não é?

Por volta dos meus 8 anos, uma situação semelhante voltou a se repetir comigo. Dessa vez, o meu algoz estava bem perto. Ele era o meu tio. Obviamente, a proximidade entre nós era algo natural, já que ele frequentava a minha casa, e eu a dele, como qualquer parente faz. Éramos vizinhos.

No começo, ele fazia certas brincadeiras que sempre terminavam com abraços ou que, de alguma forma, permitiam um contato físico entre nós. Algum tempo depois, ele disse que queria me mostrar algo em sua casa. Sem desconfiar de nada, fui até lá e acabei sendo impedido por ele de sair do local. Inicialmente, meu tio procurou estabelecer uma relação de cumplicidade, dizendo que aquele seria “o nosso segredo”, e que não poderíamos contar nada do que iria acontecer para ninguém, caso contrário, meus pais iram brigar comigo.

Quantas vezes esses encontros aconteceram?

Lembro que essa situação se repetiu algumas vezes. Não me recordo exatamente quantas. Ele encontrava formas de ficar a sós comigo e, assim, me usar como um objeto sexual. Isso aconteceu durante 1 ano, provavelmente. Talvez por medo de ser descoberto, meu tio deixou de me procurar. A violência física cessou. No entanto, as feridas deixadas por essas duas experiências que eu vivi já tinham me marcado profundamente.

Que sequelas psicológicas foram deixadas por conta dos abusos?

Não sei precisar o quanto tudo isso foi prejudicial para mim. Quando me lembro da minha infância e adolescência, vejo o quanto fui retraído, reprimido e até sentia certa culpa pelo que aconteceu. Tinha dificuldades de me relacionar com outras crianças, ou mesmo com alguns adultos, e questionava o porquê de essas coisas terem acontecido comigo. Minha relação com o meu pai não era nada boa, pois para mim era como se ele soubesse do que tinha ocorrido comigo e me rejeitasse.

Depois de tudo o que aconteceu, eu criei certa ojeriza com relação à figura masculina. Fiquei com a sensação de que qualquer homem poderia me abordar com a intenção de me molestar. Esse trauma fez com que eu me tornasse um jovem emocionalmente instável. Além disso, era constantemente criticado e rejeitado pela minha família e pelas pessoas mais próximas, pelo meu comportamento reservado. Essa insegurança e desconfiança a respeito dos homens levaram-me a fazer de minha mãe uma espécie de porto seguro. Desenvolvi uma relação de total dependência, pois tinha muito medo de perdê-la.

Você atribui a quê a virada que deu em sua vida?

Foi justamente no momento mais difícil da minha vida que eu recebi a ajuda da maior fonte de poder que existe: Deus. E Ele usou uma amiga como canal para que eu pudesse ser reconduzido ao meu caminho. Ela, sem saber dos meus problemas e complexos, chamou-me para uma reunião na Igreja Universal do Reino de Deus.

Antes de falar da minha experiência na IURD, é importante revelar que fiz primeira comunhão e fui coroinha na Igreja Católica. Quando cheguei à Universal, não imaginava que um culto religioso pudesse ser algo mais profundo, mais intenso, onde a ajuda vinha de uma maneira mais humana, urgente. Na Católica, era tudo meio engessado e formal. Não me sentia nem um pouco à vontade para relatar meus problemas ao padre, pois tinha receio de ser repreendido, de ele achar que eu estava inventando uma história.

Você procurou alguém especificamente? Como você foi ajudado na IURD?

Lembro-me como se fosse hoje. À vontade na IURD e confiante de que seria ajudado, procurei uma obreira para falar sobre meu problema. A pessoa em questão era “tia” da Escola Bíblica Infanto Juvenil (EBI). Foi uma surpresa saber que o sobrinho dela havia passado pelo mesmo problema. Por sua experiência, ela me ajudou de forma incondicional, até por ser uma situação que vivenciou em casa.

Mais integrado e cada vez mais próximo de Deus, passei a fazer parte de correntes de da Força Jovem Brasil, onde encontrei adolescentes que já tinham passado por dramas semelhantes, alguns muito piores do que o meu. Um pastor também foi fundamental para a retomada da minha autoestima. Ele me ajudou muito com propósitos de oração.

Ter dado um testemunho de libertação ajudou de que forma na sua recuperação?

O momento que marcou a minha libertação foi quando eu dei um testemunho através de uma transmissão radiofônica. Devia ter uns 13 anos, na época. Lembro-me que estava passando um feriado na casa de uns amigos, pois era aniversário de um deles. A gente acordou cedo pra ligar para um programa de rádio da IURD com o intuito de enviar uma mensagem de parabéns para ele, ao vivo. Daí eu liguei e consegui desejar os votos de felicidade. O pastor que estava comandando a atração falou que queria a opinião dos ouvintes sobre uma carta que ele havia recebido de uma pessoa que dizia ter sido abusada sexualmente. Não sei o que deu em mim, mas acabei falando que tinha vivenciado a mesma situação, e que tinha conseguido superar o problema. Nem todos na casa sabiam da minha história. Apesar do choque de alguns, todos elogiaram a minha coragem. Falei em rede estadual de rádio. Até hoje não sei se a minha mãe ou algum parente ouviu.

Como está a sua vida hoje?

Posso dizer, de todo o coração, que sou livre do fardo pesado que carregava comigo, e que é possível ser feliz e construir uma nova história. Sou casado, tenho uma família abençoada e sou eternamente grato pelo que Deus fez em minha vida. Sem Ele, não consigo imaginar o que seria de mim hoje em dia. Espero que o meu relato sirva de alerta para os pais, familiares e para toda a sociedade, sobre o perigo que uma criança corre de ter roubada de sua infância algo muito precioso: sua inocência.
redacao@arcauniversal.com
(*) O autor do depoimento pediu para ter o nome preservado, por isso foi usado um pseudônimo

Sem comentários:

Enviar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...